Artigo
Iriny Lopes, a ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres, ganhou atenção da
mídia e do público após se manifestar contrária a alguns produtos de entretenimento por
considerá-los sexistas e desrespeitosos à dignidade da mulher. Primeiro foi o pedido que
fez ao Conselho Nacional de Propaganda, para que suspendesse o comercial estrelado
pela modelo Gisele Bündchen. Na peça publicitária, a modelo ensina duas maneiras de
se dar a notícia de que bateu o carro ao marido, o jeito errado seria fazer o comunicado
vestida, e o correto, usando apenas uma lingerie.
A empresa responsável pelo comercial, a Hope, divulgou uma declaração em que
justifica a peça como um produto com viés “humorístico”. A escolha de Gisele para
o comercial, uma mulher bem sucedida profissionalmente, seria mais um fator para
ressaltar o teor cômico da peça. Para a ministra, o comercial expõe a mulher como um
estereótipo, valorizada apenas por sua sensualidade.
Na internet, é possível perceber que grande parte das pessoas discorda da ministra.
Os comentários mais comuns em sites que noticiaram o episódio são a respeito da
aparência física de Iriny Lopes. O humorista e apresentador de TV Marcelo Tas
escreveu em seu twitter que esse veto devia ser coisa de mulher feia. O desprezo
por “mulher feia” parece ser comum entre os integrantes do programa apresentado por
Tas, o “CQC”. Rafinha Bastos, outro humorista da atração, despertou a atenção ao
dizer em suas apresentações que “mulheres feias tinham que ver o estupro como uma
oportunidade” e que “o cara que estupra uma mulher feia devia ganhar um abraço”.
A ministra também soltou uma nota de apoio ao Sindicato dos Metroviários, que
se manifestou contra um quadro do programa “Zorra Total”. Nessa atração, uma
mulher “feia” e um ator representando uma pessoa transexual conversam em um
vagão de metrô. Em determinado momento, a mulher sofre abuso sexual, e a colega
transexual aconselha a amiga a aproveitar o momento. Em essência, é a mesma piada
feita por Rafinha Bastos. Mais uma vez, as pessoas se revoltaram com a ministra, ela
é “feia”, “puritana”, “sem senso de humor”.
É possível dizer que esses produtos não são sexistas? A utilização da “ultra ironia”
não perpetua estereótipos sexistas? É óbvio que a intenção do comercial, da piada e do
quadro é dizer algo tão sexista que você acaba percebendo que é sexista e ri do absurdo.
É uma espécie de comentário sórdido com uma piscadinha de canto de olho, porque
todo mundo sabe que é uma brincadeira.
Vejo como preocupante a dificuldade que as pessoas têm de reconhecer um conteúdo
sexista, de dar “nome aos bois”. Se um homem se esfrega em uma mulher no metrô,
qual o nome disso? É abuso sexual. Se uma transexual é retratada com o estereótipo de
escandalosa e promíscua, qual o nome disso? É transfobia.
É curioso como as pessoas querem fingir que as piadas estão apartadas da realidade,
mas em que contexto elas surgem? Essas ideias são criadas por humoristas reais que
em algum momento acreditaram que fazer sexo com um homem é SEMPRE uma
vantagem, e que se a mulher for feia deveria ficar contente com qualquer parceiro,
porque mulher feia não tem direito de escolha.
Aliás, mulher feia não tem direito nem a opinião. A ministra não é “bonita”, então deve
ficar calada, esse é o grande argumento de seus opositores. “não me sinto sexualmente
atraído por você, portanto sua opinião não tem importância”, essa é a lógica. Mas e
se você for bonita? No comercial em que Gisele conta que bateu o carro do marido,
como ela é sensual, o que diz também não importa, o foco está em seu corpo. Então,
de qualquer forma, se você é mulher, o que você fala não tem relevância para essa
sociedade. E clamam por senso de humor, querem que levemos na brincadeira, e quando
é que as mulheres vão ser levadas a sério.
Mulheres estudam em média dois anos a mais do que os homens, porém ocupam menos
cargos de liderança e ganham menos do que os homens para desempenhar as mesmas
funções. Quem quer rir disso?
Priscila Fernandes da Silva (AgênciaJor/Uniso)
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