terça-feira, 8 de novembro de 2011

Feministas não têm senso de humor, já os misóginos estão gargalhando

Artigo



Iriny Lopes, a ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres, ganhou atenção da mídia e do público após se manifestar contrária a alguns produtos de entretenimento por considerá-los sexistas e desrespeitosos à dignidade da mulher. Primeiro foi o pedido que fez ao Conselho Nacional de Propaganda, para que suspendesse o comercial estrelado pela modelo Gisele Bündchen. Na peça publicitária, a modelo ensina duas maneiras de se dar a notícia de que bateu o carro ao marido, o jeito errado seria fazer o comunicado vestida, e o correto, usando apenas uma lingerie. 

A empresa responsável pelo comercial, a Hope, divulgou uma declaração em que justifica a peça como um produto com viés “humorístico”. A escolha de Gisele para o comercial, uma mulher bem sucedida profissionalmente, seria mais um fator para ressaltar o teor cômico da peça. Para a ministra, o comercial expõe a mulher como um estereótipo, valorizada apenas por sua sensualidade. 

Na internet, é possível perceber que grande parte das pessoas discorda da ministra. Os comentários mais comuns em sites que noticiaram o episódio são a respeito da aparência física de Iriny Lopes. O humorista e apresentador de TV Marcelo Tas escreveu em seu twitter que esse veto devia ser coisa de mulher feia. O desprezo por “mulher feia” parece ser comum entre os integrantes do programa apresentado por Tas, o “CQC”. Rafinha Bastos, outro humorista da atração, despertou a atenção ao dizer em suas apresentações que “mulheres feias tinham que ver o estupro como uma oportunidade” e que “o cara que estupra uma mulher feia devia ganhar um abraço”. 

A ministra também soltou uma nota de apoio ao Sindicato dos Metroviários, que se manifestou contra um quadro do programa “Zorra Total”. Nessa atração, uma mulher “feia” e um ator representando uma pessoa transexual conversam em um vagão de metrô. Em determinado momento, a mulher sofre abuso sexual, e a colega transexual aconselha a amiga a aproveitar o momento. Em essência, é a mesma piada feita por Rafinha Bastos. Mais uma vez, as pessoas se revoltaram com a ministra, ela é “feia”, “puritana”, “sem senso de humor”. 

É possível dizer que esses produtos não são sexistas? A utilização da “ultra ironia” não perpetua estereótipos sexistas? É óbvio que a intenção do comercial, da piada e do quadro é dizer algo tão sexista que você acaba percebendo que é sexista e ri do absurdo. É uma espécie de comentário sórdido com uma piscadinha de canto de olho, porque todo mundo sabe que é uma brincadeira. 

Vejo como preocupante a dificuldade que as pessoas têm de reconhecer um conteúdo sexista, de dar “nome aos bois”. Se um homem se esfrega em uma mulher no metrô, qual o nome disso? É abuso sexual. Se uma transexual é retratada com o estereótipo de escandalosa e promíscua, qual o nome disso? É transfobia. 

É curioso como as pessoas querem fingir que as piadas estão apartadas da realidade, mas em que contexto elas surgem? Essas ideias são criadas por humoristas reais que em algum momento acreditaram que fazer sexo com um homem é SEMPRE uma vantagem, e que se a mulher for feia deveria ficar contente com qualquer parceiro, porque mulher feia não tem direito de escolha. 

Aliás, mulher feia não tem direito nem a opinião. A ministra não é “bonita”, então deve ficar calada, esse é o grande argumento de seus opositores. “não me sinto sexualmente atraído por você, portanto sua opinião não tem importância”, essa é a lógica. Mas e se você for bonita? No comercial em que Gisele conta que bateu o carro do marido, como ela é sensual, o que diz também não importa, o foco está em seu corpo. Então, de qualquer forma, se você é mulher, o que você fala não tem relevância para essa sociedade. E clamam por senso de humor, querem que levemos na brincadeira, e quando é que as mulheres vão ser levadas a sério. 

Mulheres estudam em média dois anos a mais do que os homens, porém ocupam menos cargos de liderança e ganham menos do que os homens para desempenhar as mesmas funções. Quem quer rir disso? 

Priscila Fernandes da Silva (AgênciaJor/Uniso)

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